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10 janeiro, 2005

Dane-se o Grande Irmão
Por Fran Pacheco

"Seja imbecil, ganhe um milhão."


Não se pode ganhar todas... O fato de eu estar de fora da nova edição do Big Bode só me desperta (de leve) um sentimento sereno de ódio, inveja, desprezo e azia. Que grande autista o Brasil vai deixar de conhecer. E que grande bolada eu vou deixar de levar pra tumba. Treinei durante meses o meu personagem: tosco, bronco, semi-analfabeto, desdentado, atarracado, malandro, mulherengo, malemolente, bom de copo, bamba no gingado, cheio de bossa e marcas de varíola na cara, vivendo de expedientes, connoisseur de mé, priápico, deslumbrado, abusado. Uma barriga indecente de chopp cotada para ser o xodó do verão. Só não daria pra ser mulher, mãe-solteira e favelada. Aí sim, seria batatíssima. O prêmio já estaria garantido por antecipação.

O Brasil iria se deliciar com meu carregadíssimo sotaque (arduamente ensaiado) de cabocão pávulo (caipira ficou demodé). Minhas expressões regionais como "ulha, já!", "Eras, maninha!", "Já me vu", virariam bordões nacionais. Em cada padaria e repartição do país, o povo exclamaria: "tu é leso, é?" (ou na forma sucinta: "télesé?") Nem preciso falar que, ao sair da redoma, depois de posar nu para a The Economist, seria recebido como herói em minha terra e ganharia pensão eterna, como embaixador perpétuo da cultura cabocla.

Típico exemplar do "machão latinoamericano", eu aumentaria em várias polegadas a audiência nacional, abatendo todas, todas as lebres da casa, sem o auxílio de edredons ou cafofos. Como diria mestre Zé Trindade, "comigo é no jiló!". Praticaria com as donzelas, a céu aberto e à flor da pele, aquilo que Shakespeare chamou de "monstro de duas costas" (o que será, que será?).

Mas haveria os riscos. Pedro Bial, intelectual não-praticante e agora puxa-saco post-mortem do Dotô Roberto Marinho, bem que tentaria me desmascarar. Soltaria uns versos do Guinsberg ou do Rimbaud como quem não quer nada, só para me forçar, num ato falho, a um comentário como "Não me conformo por Rimbaud ter parado de compor aos 21 anos, maninha. Je ne compris pas! Mas ulha já, a tradução do Ivo Barroso até que tá ajeitadinha". Seria o meu fim... E se, falando dormindo, eu desatasse a declamar a plenos pulmões a Ode Marítima do Fernando Pessoa? Mico maior não poderia haver! Eu estaria fadado a ser entrevistado pelo Abujamra.

Ainda bem que eu nem sequer me inscrevi. Não se pode enganar todo mundo o tempo todo. Principalmente sem distribuir propina. O povo não é besta, só tem eventuais recaídas. E dá licença, que eu vou dar uma espiadinha antes que a novela das oito comece.