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05 dezembro, 2004

Incompreensão e música de elevador
Por irmão Paulo

Antes me espantava com a capacidade que as pessoas tinham, em geral, de distorcer minhas opiniões. Hoje, já há tempos na verdade, vejo que todos compreendem o que querem compreender e já não espero nada de ninguém. Faço meu trabalho, aquele para o qual vim ao mundo, estoicamente. Sem esperar reconhecimento ou compreensão.

Assim, o bostíssimo Festival de Cinema foi uma iniciativa importante e louvável. Ninguém nunca tinha feito algo assim antes. Cheio de erros e raro de acertos, mas as primeiras pedaladas são sempre as mais difíceis. O tal insucesso de público (relativo, pois coisa boa acaba sendo pra pouca gente mesmo) pode até ser um dado positivo, numa cidade cujo público leva Amazonino e Serafim pro segundo turno. A Mostra Paralela e as exibições no largo salvaram a festa. Ano que vem vai ser melhor, se resolverem trocar de festival e fazer o meu. O resto são sombras de árvores alheias.

A turma que chacoalha com a iniciativa é a mesma que incensa gente como Tom Jobim. Registro 10 anos de sua partida, ou vinda. Tom, o incompreendido Rei do Elevador, superou até Henry Mancini que pontificou absoluto durante décadas.

Rejeita-se a expressão, quase sempre utilizada em tom depreciativo. Música de elevador é um termo cunhado para designar a música tocada em bares, restaurantes, elevadores (quando os elevadores tinham música), enfim em ambientes onde deveria servir de fundo musical, sem atrapalhar a vida e os pensamentos das pessoas.

Tom Jobim, na verdade, foi um músico popular de amplitude limitada. Até meu ouvido de lata percebe que Samba de uma Nota Só é puro Nigth and Day. Nas poucas vezes que ousou fugir ao café-com-leite bossanovista e arriscar na música séria deu-se mal. Sua Sinfonia de Brasília, que deveria ser algo grandioso e futurista, como o momento e a cidade, ao estilo de um Assim Falou Zaratustra – só que no cerrado, acabou um arremedo de sinfonia villa-lobosiana, fazendo com que o fundo musical oficial de Brasília tivesse, ainda, gosto de Estado Novo.
Era também limitado em outros aspectos. Quando moço, músico preocupado com o cachê para pagar as contas. Depois, rico, em buscar uma causa que lhe desse norte, achou-a no super marketing de ecologista. Nunca foi um pensador como Chico Buarque, investigador de costumes como Noel Rosa ou mesmo de sons e ritmos como Villa-Lobos. Despolitizado, mas por não entender de política. Bonito, foi um traçador de mulheres. Talhou-se, assim, para ser compositor de música de elevador.

Nesse tipo de música, que se escuta durante tempo interminável sem enjoar, Tom permanece imbatível. Nada melhor para preencher os espaços vazios numa reunião de amigos em casa, num almoço descontraído e charmoso, em momentos mais promissores com a mulher desejada que um legítimo Tom Jobim de elevador (ou de avião) no som. Sem ser cantado por ele, obviamente, para não tisnar suas obras-primas com seu mugidos sofridos. Um brinde ao inesquecível Tom e, waaal, à sua insuperável obra de elevador.